Epic Games vs. Futsac: o embate entre propriedade intelectual, inovação local e gigantes globais

Adriana Brunner • 6 de maio de 2025

O embate judicial entre a gigante norte-americana Epic Games, criadora do fenômeno mundial Fortnite, e o empreendedor curitibano Marcos Juliano Ofenbock, idealizador do esporte e da marca Futsac, é mais do que uma disputa por um nome: trata-se de um caso emblemático que levanta questões centrais sobre direitos de propriedade intelectual, assimetrias de poder no mercado global e os limites da proteção de marcas no ambiente digital.


O conflito: um emote, uma marca e duas interpretações


O centro da disputa está no uso do nome "Futsac" como emote vendido dentro do jogo Fortnite, disponível para jogadores por meio de microtransações. O termo, que também dá nome ao esporte criado por Marcos em Curitiba e à marca que ele registrou no INPI, foi usado no jogo sem sua autorização, segundo o empresário. Para ele, o nome não é genérico, mas parte de um conjunto de ativos intangíveis protegidos legalmente e associados à sua criação.


A Epic Games, por sua vez, alega que o termo é descritivo — uma junção natural de "futebol de saco" — e que, portanto, não poderia ser apropriado de forma exclusiva. A empresa sustenta ainda que atua em um mercado distinto (games), diferente daquele de Marcos (artigos esportivos), e que o nome do emote em inglês (Sackin') reforça essa separação. Contudo, o uso insistente do termo "Futsac" na versão brasileira do jogo, mesmo após notificação extrajudicial, evidencia a complexidade do conflito.


Marca registrada: proteção legítima ou apropriação indevida?


No cerne jurídico da controvérsia está o artigo 124, inciso VI, da Lei da Propriedade Industrial (Lei 9.279/96), que proíbe o registro de nomes genéricos ou descritivos como marcas exclusivas. A defesa da Epic apoia-se nesse artigo para tentar invalidar os registros de Marcos. Já o empreendedor argumenta que, além de criador do esporte, vem desenvolvendo e promovendo a marca Futsac desde 2011, com reconhecimento oficial pelo Ministério do Esporte, integração à grade escolar no Paraná e envolvimento de cooperativas locais, como a Associação Curitibana de Crochê.


A questão central, portanto, não é apenas semântica — se “futsac” é ou não um termo comum — mas de histórico de uso, originalidade da criação, e associação de marca. O fato de Marcos ter obtido registros em diversas classes no INPI, incluindo as de entretenimento e educação (Classe 41), indica que ele buscou justamente resguardar o nome em múltiplos contextos de mercado, o que é uma prática comum de proteção de ativos intangíveis.


Impactos econômicos e sociais para o empreendedor


O processo já gera impactos econômicos concretos para o projeto de Marcos: negociações com investidores foram paralisadas e a produção das bolas artesanais de crochê foi interrompida, gerando efeitos em cadeia sobre a economia local e o trabalho de artesãs. Esse é um dos aspectos mais delicados da situação: o enfraquecimento de negócios locais diante de grandes corporações internacionais, que muitas vezes atuam em zonas cinzentas do direito para consolidar seu domínio no mercado.


Ainda que a Epic argumente que não há intenção de prejudicar um empreendimento local, o uso comercial reiterado de um nome potencialmente protegido, mesmo após contato do titular da marca, levanta sérias dúvidas sobre a ética empresarial e o respeito às legislações nacionais.


Propriedade intelectual em tempos de plataformas globais


O caso levanta um ponto mais amplo e estrutural: a fragilidade dos sistemas nacionais de PI frente ao poder das plataformas digitais globais. Quando empresas como Epic, Amazon, Apple ou Meta atuam em múltiplos mercados simultaneamente, o conceito de exclusividade territorial das marcas — como ainda rege o sistema do INPI — torna-se mais vulnerável. Isso pressiona países como o Brasil a modernizar seu marco legal e seus mecanismos de defesa comercial, para proteger melhor os empreendedores locais e garantir a equidade de condições no comércio internacional.


Conclusão: o que está realmente em jogo


O que está em jogo não é apenas o direito ao uso de uma palavra. Trata-se da soberania sobre uma criação cultural legitimada institucionalmente, da capacidade de pequenos negócios defenderem suas marcas em ambiente globalizado, e da efetividade do sistema jurídico brasileiro em garantir a segurança jurídica necessária ao fomento da inovação local.


A disputa entre Epic Games e Marcos Ofenbock é simbólica de um tempo em que os ativos imateriais se tornaram o centro da economia. Se a propriedade intelectual é o que permite transformar ideias em valor, sua proteção eficaz é essencial para que a inovação brasileira tenha voz, espaço e futuro.


https://www.tribunapr.com.br/noticias/curitiba-regiao/gigante-norte-americana-de-games-processa-empreendedor-curitibano/

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